
Há muitos anos que os passos me levam por casas alheias.
Por casas de outros. Por vidas de outros. Por rotinas de outros.
Há muitos anos que é comum ganhar lugar em lençóis esticados em camas diferentes, pertencentes a gente distinta.
Em toda essa dança de passagens, algo comum: a convivência desde dentro com outras formas de viver, de organizar os dias, de fazer e sentir casa.
O passar dos anos, o olhar filtrado, a atenção aos detalhes vão construindo na minha percepção uma teia de corpos distintos e das formas como esses corpos deslizam quando estão no seu lugar mais privado: a sua casa.
Onde guarda cada um os talheres, o que faz mal acorda, onde pendura as toalhas, a que faz cheirar os espaços? Que sons inundam os seus dias, o que lhes decora as paredes? Quanto de cada um ocupa a casa que habita?
Como se faz uma pessoa no espaço que ocupa e como ocupa o espaço uma pessoa enquanto se faz ?
Nas diferentes casas encontram-se mundos inteiros. Mundos de sentir, mundos de vida inteira. Histórias vividas, sonhos por existir, desejos que só um sofá conhece, tristezas de que só uma cama ouviu falar.
Objetos-âncora aos quais se volta nos dias. Conforto em forma de fotografia, de moldura, de tecido.
A passagem por tantos lugares amplia o mundo de possibilidades.
Como se se percebesse que todas as formas de vida são possíveis e concretas. Como se se visse desde dentro a forma como cada corpo cresce e se ocupa do mundo no seu território privado.
Tantos corpos como casas. Tantas vidas como os lugares que habitam. Tantas diferenças como lugares percorridos.
E entre todas as diferenças e pedaços, o espaço comum do humano. Do humano com corpo fincado no seu chão, no solo que o abriga, onde cresce e desembrulha os dias.
A casa onde abriga o corpo, o corpo a que chama casa.
Tantos corpos como casas.
Edite Amorim, 14 Julho'15
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