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Crónicas

Janeiro 2015


Pedaços de Pensar Grande
"Mais perto do que longe"

Fechei a tampa do computador. Clap.
Fechei-a.
O Facebook contava-me de amigos em viagens, de conhecidos em refeições, de colegas em projetos.
O Twitter falava-me de ideias de empresas, de citações de autores, de notícias de jornais, de imagens de arte.
O LinkedIn falava-me de atualizações de aptidões de outros, de projetos de outros, de trabalhos de outros.

E eu fechei o computador porque na realidade estava cansada dos outros longe e me apeteciam outros perto.
E fechei o computador e fiquei a olhar à volta. À volta, no café onde estou sentada, na Casa da Música.

Está cheio. É Domingo à tarde e isto podia ser uma representação em curto espetro de boa parte do Mundo.

Há gente que fala línguas diferentes, com estilos diferentes e notoriamente de mundos diferentes.
Uns usam o computador, outros livros, outros o olhar, a voz, o toque.
Ouvem música, ouvem nada, ouvem-se uns aos outros.

Não sei nada do que estão a fazer. Quem são, em que trabalham, quais as opiniões deles, o que comeram.
Não faço ideia dos gostos deles, das relações deles, de quem são os amigos deles.
Não sei que livros leram, que filmes viram nem o que vão fazer hoje à noite.

São pessoas. Pessoas como eu.
E nesta diferença do tudo que as envolve, somos todos tão mais parecidos do que diferentes...

Eu não canto ópera como os da mesa diferente, mas gosto de a ouvir. Eu não percebo de Design como os da mesa do lado, mas gosto de o ver. Eu não namoro com o casal de trás, mas gosto de os sentir.
É como se algo invisível nos unisse a todos, de algum modo, no que nos define como Humanos.

Fico a imaginar as parecenças invisíveis. Sei que alguém nesta sala também descasca as cebolas como eu. Sei que alguém que está neste espaço também adora vermelho como eu. Sei que alguém aqui também espirra com alguns gatos, gosta de canetas de cores, se emociona com certos quadros, já chorou com certa música, se ri de certas piadas, chapinha numa poça de chuva ou veio sem guarda- chuva de propósito, como eu.

Sei que podia ir de mesa em mesa e encontrar afinidades.

Com umas pessoas, afinidades para partilhar durante horas. Com outras, um sorriso breve de um segundo.
Mas com todas, com todas e com cada uma delas encontraria um ponto comum, fosse centrado numa ideologia política, num conceito filosófico, num hábito de poupança ou numa mania partilhada.

Somos tão perto. E às vezes pomo-nos tão longe...
Enquanto escrevo no papel vou olhando à volta. Levanto a cabeça para observar, como se estivesse a fazer desenho à vista. Troco olhares sem querer e quase me apetece dizer: “Sim, estou a escrever sobre vocês. Sobre cada um de vocês, que nem sou capaz de enumerar. Escrevo que somos todos parecidos. Não acham? Somos todos parecidos. Mais parecidos do que diferentes. Mais perto do que longe. Não acham?”

Não sei se acham, nem se é óbvio..

Às vezes é difícil aceitar o perto que estamos.
Às vezes é difícil aceitar as parecenças quando o que procuramos é um lugar só nosso. Às vezes é difícil procurar o território comum, neste convite aberto de uma sociedade que nos pede para sermos únicos.
Seremos únicos, sim. Mas únicos dentro de um infinito limitado a ser Humano.
E por isso estamos perto.

Será que andar pela vida, pelos dias, pelo quotidiano pequenino com esta ideia presente nos faria mais disponíveis para conversar com a senhora do lado no metro, com a jovem da frente na fila, com o velhinho a escolher maçãs da mesma caixa na frutaria?
O que ganharíamos por aceitar mais perto os outros?
O que se evitaria por ver neles gente próxima em vez de seres distantes?
O que se tornaria possível por encurtarmos distâncias que na realidade nem lá estão?

Intuo, sinto, sei que estamos todos mais perto do que longe; que somos todos mais parecidos do que diferentes; que somos todos mais parte do mesmo do que pedaços soltos de algo.

E que o aproximar desse espaço comum começa nesta sensação de Possível.

Estamos todos perto. E abro de novo o computador para pegar nestas palavras e as levar a quem as leia e eventualmente as sinta e, com esse movimento, ficar mais perto de alguém de quem nunca vi a cara.

Estamos todos perto. E se assim for, ou se assim não for, era bonito receber um e-mail a contar. Aproxima-te, queres?

pessolet@gmail.com

Edite Amorim, 18 Janeiro'14
www.thinking-big.com/blog

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